Assédio sexual às mulheres

Assédio sexual às mulheres

Entrevista concedida à Rádio Inconfidência, programa Revista da tarde, quadro Amor e Sexo – 17/11/2015

Um terço dos assédios a mulheres acontece no transporte público, outro terço das ofensas acontece na rua, segundo mulheres ouvidas em pesquisa DataFolha. Ativistas e grupos de feministas cobram de empresas ações para coibir abusos nos trens, ônibus e metrôs. Porque isso acontece? Qual o perfil dessas mulheres? Essas e outras perguntas nós vamos fazer agora a Sexóloga Sônia Eustáquia Fonseca.

1 – Na superlotação de ônibus, trens e metrôs que circulam nas capitais Brasileiras, usuários se espremem uns contra os outros, seria essa a principal causa de tanta queixa de assédio, feita pelas mulheres que fazem usos do transporte coletivo?

Esse roçado facilita “mãos bobas” nada bobas, sussurros indecorosos e en-coxadas propositais. Segundo levantamento, que entrevistou 1 092 homens e mulheres, o transporte público é o local onde mais ocorre o assédio às mulheres, onde a porcentagem é maior no assédio físico e depois vem o verbal.

2 – As mulheres se queixam da rua como palco de assédio? a balada e o trabalho também entram na estatística? O que os movimentos ativistas têm feito para combater o assédio?

Depois do transporte coletivo vêm a rua, a balada e o trabalho. Existe uma movimentação de ativistas e de coletivos feministas para que as empresas de transporte público criem campanhas e mecanismos facilitadores de denúncia. O assédio sexual, de maneira específica, é uma das grandes aflições que atingem mulheres de todas as idades, classes e etnias, restringindo sua liberdade, seja de ocupar determinados espaços públicos ou de andar sozinha em certo horário, seja de escolher o que vestir.  No caso do assédio sexual no ambiente de trabalho, há o agravante de, na maioria das vezes, envolver não apenas a relação de opressão de gênero, mas também a opressão de classe.

O assédio sexual no trabalho precisa ser entendido como uma forma de discriminação no emprego, que viola o direito das trabalhadoras de segurança no trabalho e igualdade de oportunidades, sem contar os prejuízos a sua saúde e bem-estar físico e psicológico. Partindo dessa noção, pode-se compreender que o combate efetivo ao assédio sexual no trabalho só é possível por meio da luta pela igualdade entre os sexos em todas as esferas sociais.

3 – Será que as empresas de transporte sabem a gravidade da situação e não fazem nada, ou não sabem mesmo o que acontece por falta de pesquisas de satisfação dessa clientela que utiliza os veículos coletivos?

Elas não desenvolvem pesquisas sistemáticas. Vez ou outra se arriscam a fazer alguma indagação aos seus usuários, eu creio que temem as críticas e principalmente às ações que devem ter que praticar para sanar as queixas e críticas dos usuários. Existem poucas mulheres nesse mercado de comando do transporte coletivo, e isso pode ser um agravante.

4 – Quais são as principais providencias que essas empresas podem tomar?

Fazer campanhas de conscientização dos usuários, canais de denúncia e treinamento de pessoal. E tem que ser um processo contínuo e não apenas pontual. Pesquisas realizadas em Metrôs de São Paulo apontam que depois dessas ações aconteceu um aumento enorme de manifestações pelo SMS-denúncia de 2013 até o momento. Quando compararam, em 2013 foram 10 casos, em 2014, 61 casos e, até outubro de 2015, 111 casos. Também ouve um aumento em boletins de ocorrência que resultaram na identificação e encaminhamento dos infratores.

5 – No início do mês, o caso da participante de 12 anos do “MasterChef júnior” foi alvo de comentários de cunho sexual nas redes sociais, isso ajuda a abrir a “questão do assédio” e a violência à mulher?

Com certeza. Só porque a garota é bonita e se torna uma pessoa pública, não dá direito a ninguém a praticar esse abuso. O caso dela motivou a campanha #primeiroassédio e abriu o debate sobre a violência à qual as meninas estão submetidas desde cedo. A pesquisa Datafolha aponta que 51% das mulheres que sofreram assédio na vida foram alvo até os 17 anos e 12% delas antes mesmo dos 12 anos de idade.  O assédio pode ser conceituado como toda a conduta de natureza sexual não desejada que, mesmo repelida, é reiterada continuamente, gerando constrangimento à intimidade do assediado. Assim, não apenas o ato sexual em si, mas atitudes como cantadas rejeitadas, piadinhas e comentários constrangedores, que colocam a vítima em situação de coação psicológica, podem ser enquadrados como assédio sexual.

6 – A cultura atual, onde o corpo feminino é sexuado muito cedo pode ser responsabilizada por essa quantidade de assédio?

Eu creio que seja um dos fatores, mas não o único. A educação que um menino recebe é diferente da educação oferecida à menina. Como forma preventiva eu acredito na educação sexual realizada pelas famílias, escolas e sociedade.

A solução pode estar no empoderamento da mulher, para que ela tenha consciência de quando está sendo abusada e para que saiba que em hipótese alguma a culpa é dela.  Todos e todas devem saber que o corpo de uma pessoa é uma exclusividade dela, a roupa que uma mulher usa, por exemplo, não diminui esse direito. Aliás, roupa não previne o estupro em lugar nenhum do mundo. A forma como fala, anda ou se comporta, nada disso é determinante. Em resumo: é  empoderar as mulheres para que elas saibam que ninguém pode tocá-las sem consentimento.

7 – No plano educacional a campanha seria bem vista? As Escolas fariam adesão ao projeto contra o assédio?

Eu creio que alguns em particular fariam com os alunos a sensibilização; aquelas escolas mais abertas que percebem a questão como um problema social e cultural grave. Outras ainda encontrariam resistência nos planos educacionais mais vastos. Veja a questão da sexualidade como tema transversal, por exemplo; até hoje encontramos resistência por parte de alguns representantes do governo que tentam tirar da sala de aula esse conteúdo, com a alegação de estar incentivando a prática sexual.

8 – Quais são as consequências emocionais para uma mulher que sofreu assédio na infância?

São inúmeras. Ninguém passa ileso à um abuso ou agressão sexual. Essas mulheres mais tarde, na vida adulta, vão desenvolver uma disfunção sexual ou no mínimo terem problemas com a auto estima. Elas também podem adoecer fisicamente, numa reação psicossomática.

9 – Qual é o perfil social da Mulher assediada?

No final de outubro , I 092 paulistanas foram entrevistadas em uma pesquisa realizada pela Datafolha e 36 % responderam que já tinham sofrido assédio e 64% que não havia sofrido. Nesse universo, 74% eram mulheres e 16% homens. 50 % das mulheres assediadas tinham nível médio de escolaridade e 42% ganhavam entre 2 a 5 salários mínimos. A idade em que sofreram o primeiro assédio é que é preocupante: 39% delas responderam que foi entre 12 a 17 anos.

10 –  As mulheres demoram muito para fazer a denúncia na polícia… as crianças e adolescentes nem sabem exatamente o que está acontecendo e por isso não contam aos pais… isso retardaria o processo de punição aos infratores, não é?

Sim. O fato de não denunciar aumenta a impunidade. Nossa legislação sobre o tema, apesar de um pouco tardia, prevê sanções tanto para o assediador, quanto para o empregador que for conivente ou omisso a esse tipo de conduta. Na esfera penal, o assédio sexual vem regulado no artigo 216-A do Código Penal, prevendo pena para o assediador de um a dois anos de detenção. Já na esfera trabalhista, o assediado tem direito à rescisão indireta de contrato, tendo também o empregador responsabilidade objetiva e subsidiária em caso de indenização por dano moral por assédio cometido por seu preposto.

11 – O que leva alguém a assediar?

A atitude pode ser originada por um transtorno de impulso. Transtorno de impulso é quando uma pessoa tem vontade de alguma coisa e não controla. É normal andar na rua e achar uma pessoa bonita, mas isso não significa que você tem permissão para agarrá-la. Esta alteração psicológica faz com que a pessoa não tenha limites e nem freio social frente aos impulsos.

Por mais que o indivíduo seja fruto das experiências que viveu ao longo da vida, a atitude está relacionada ao caráter. Infância conturbada ou cheia de violências e desrespeitos pode estar relacionada a essas práticas. Mas não necessariamente. É preciso existir uma predisposição de caráter para que haja esta prática. E o caráter é inato e não adquirido.

E o que fazer?

Além de buscar pela polícia e pelas autoridades do transporte público para realizar uma denúncia, também é possível ligar para o 180, número da Central de Atendimento à Mulher, do Governo Federal.

Punição

As punições individuais podem inibir alguns maníacos. Outras ações mínimas que se espera são de ordem municipal, como: iluminação pública, saneamento básico, transporte 24h. Prefeituras que não iluminam as ruas, que não limpam os matos das praças, canteiros, terrenos e que não disponibilizam transporte público 24h, acabam por facilitar a violência contra os diversos tipos humanos.

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