A Idade Pouco Importa

A idade pouco importa

Mulheres que tiveram filhos depois dos 40 anos mostram disposição e maturidade para encarar os desafios da maternidade. Adiar a gravidez é uma decisão cada vez mais comum no Brasil

Reportagem de Celina Aquino

Jornal Estado de Minas – domingo, 08 de maio de 2016 – Caderno feminino & masculino

Em primeiro lugar está o crescimento profissional. Depois vem a estabilidade financeira. As viagens pelo mundo e a busca por um relacionamento estável também estão à frente dos planos de ser mãe. É cada vez maior o número de mulheres que decidem formar uma nova família depois dos 40 anos. No Dia das Mães, o Feminino & Masculino conta a história inspiradora de duas mineiras que esperaram mais tempo para engravidar, e não se arrependem. Elas provam que a experiência de gerar uma criança é transformadora, independentemente da idade.

Ter filhos nem passava pela cabeça da arquiteta Alessandra Conradt antes dos 30 anos. Diante do exemplo da mãe, que engravidou aos 44, ela sempre achou que a maternidade tardia traz ganhos, especialmente o rejuvenescimento. “É um respiro ter uma criança que traz toda a alegria e ânimo para dentro de casa. Sinto que a minha mãe é antenada e está sempre atualizada por ter vivido mais tarde essa experiência”, justifica. O lado negativo de adiar a gravidez nunca permeou os pensamentos da arquiteta, por isso ela decidiu focar no trabalho antes de formar a família.

Cinco anos depois de se casar, Alessandra começou a planejar o primeiro filho com o marido, o administrador de empresas Rodrigo Lapertosa, de 51, e não demorou a engravidar. “Muitas vezes, a mulher que é mãe depois dos 40 anos tentou muito antes, mas no meu caso não senti aquela tensão. Nem precisei de tratamento e em menos de seis meses estava grávida”, conta a mãe de Clara, de 3, que nasceu com síndrome de Down. “Ser mãe é uma aventura. Você tem que lidar com imprevistos o tempo todo e aprender com eles”, acrescenta.

Para a arquiteta, a idade não deve ser uma preocupação. “Saber que em determinada idade existe menor índice de erros genéticos não significa nada. Não é uma estatística que vai dizer a hora certa para engravidar. Se você só consegue ter filho depois dos 40 anos, vai nessa, não tenha medo, pois a experiência é muito bacana. O aprendizado vale muito a pena, independentemente da idade”, opina. Certa de sua escolha, Alessandra enxerga outras vantagens em ter aguardado mais tempo para ser mãe: além da maturidade, ela se sente mais tranquila para priorizar a maternidade, reduzindo a jornada de trabalho para estar o maior tempo possível perto da filha.

Aos 45 anos, a arquiteta revela que está tentando uma segunda gravidez. “Sempre pensei em ter um filho só, porque sou filha única, mas me deu vontade de ter mais um”, diz.

Na visão da psicóloga e sexóloga Sônia Eustáquia, as mulheres contemporâneas buscam o que as gerações anteriores não tiveram: liberdade de escolher se querem ter filhos, quantos serão e em que época engravidarão. Ainda na década de 1960, o advento da pílula anticoncepcional ajudou a dar poder de decisão ao sexo feminino. Hoje, as brasileiras se sentem donas da própria vida e não estão mais dispostas a se deixar levar pela pressão social. “Elas querem ter uma boa condição econômica, viajar bastante e ficar bem profissionalmente para depois fazer a escolha”, analisa.

A decisão parece ser simples, mas não é raro ter que lidar com dúvidas, angústias, medos e culpas. Sônia cita o poema Ou isto ou aquilo, de Cecília Meireles, para lembrar que não há motivo para sofrimento, pois com o tempo todo somos obrigados a escolher um caminho. “Todas as alternativas são boas, mas você tem que ser responsável pela sua escolha e até ser feliz diante dela”, defende. A psicóloga leva a reflexão para a maternidade. “Se a mulher vai mesmo fazer a opção de engravidar só depois dos 40 anos, tem que ficar tranquila e não se sentir culpada, pois não está cometendo nenhum crime.” Administrar o livre-arbítrio é mesmo um desafio, ela conclui.

A servidora pública Vânia Borba Fonseca, de 53, não tem dúvida de que engravidou na hora certa. Mãe aos 51 anos, ela imagina que não teria se dedicado tanto à filha na juventude. “Já fiz a faculdade que queria e estou com a vida profissional estabilizada, então tenho tempo e serenidade para curtir minha filha. Não tem nada que seja mais importante que ela”, diz. Apenas na parte da tarde elas se separam. Como nunca quis ter babá, ela deixa a filha na escola enquanto trabalha. O projeto para quando se aposentar, em 2018, é ser mãe em tempo integral de Luísa, hoje com dois anos.

Ajuda Personalizada

A maternidade não fazia parte dos planos de Vânia. Nem ela nem o marido pensavam em ter filhos. “Tenho muitos sobrinhos e isso me supria. Sempre gostei de criança, mas não me enxergava como mãe”, conta. Até que o desejo de engravidar falou mais alto e o casal buscou ajuda especializada para que o sonho se tornasse realidade. Vânia estava com 49 anos. “Tive que tomar hormônio porque, se deixasse só para a natureza agir, a chance seria ínfima.”

Com a saúde em dia, a única restrição era o parto normal. A gravidez transcorreu sem sustos ou enjoos e Vânia nem precisou fazer repouso, ela trabalhou até Luísa nascer, no tempo certo. A servidora pública até que gostaria de ter outro filho, mas com a ameaça do zika vírus – que parece ter relação com casos de microcefalia – ela prefere não arriscar. “Vale muito a pena ser mãe, só se lembrem de cuidar da parte física para que a gravidez não venha a trazer nenhum transtorno. Não tive dores ou desconfortos, o que tornou o momento ainda mais lindo. É incrível a sensação de sentir a barriga crescendo”, descreve.

O futuro de Luísa às vezes preocupa Vânia, por isso ela e o marido, o professor Marcelo Marchesin, de 48, criam a menina para ser bem resolvida e autossuficiente. “Como ela não tem irmãos e nossa diferença de idade é grande, a tendência é que fique sem os pais, mas a minha família é imensa e esse respaldo me deixa muito tranquila. Se vier a faltar, sei que a Luísa vai ter apoio incondicional dos parentes e não vai se sentir sozinha no mundo.” Seguindo o exemplo da mãe, que tem 77 anos e continua produtiva, ela espera ver Luísa se casar e ter filhos.

Teoricamente, a mulher está mais preparada para a maternidade depois dos 40. “A mãe mais velha é mais serena, mais estratégica para lidar com as questões da casa, reclama menos e tende a se tornar melhor educadora, conduzindo os filhos com um pensamento mais sensato, muito diferente de uma jovem que está gananciosa pela vida”, opina a psicóloga e sexóloga Sônia Eustáquia. Mesmo que trabalhem em ritmo acelerado, elas dão conta da tarefa. A mãe da Luísa derruba facilmente o mito de que falta pique. Hoje com 53 anos, Vânia senta no chão, corre, brinca de cavalinho e não se cansa de acompanhar a filha.

Impacto na fertilidade

É fato que o relógio biológico nem sempre está alinhado ao desejo da mulher de ser mãe. Enquanto muitas brasileiras decidem adiar a chegada do primeiro filho, as estatísticas provam que a melhor alternativa é tentar ajustar os ponteiros, a fim de evitar dor de cabeça. “Não quero dizer que as mulheres com mais de 35 anos não vão engravidar espontaneamente, mas os números de casos de infertilidade vão aumentar”, alerta o ginecologista especializado em medicina reprodutiva João Pedro Junqueira, diretor da clínica Pró-Criar, em Belo Horizonte.

A chance de engravidar diminui drasticamente com o tempo. Segundo o especialista, abaixo dos 35 anos a probabilidade é de 20% ao mês. Depois dos 40, o índice cai para 5% ao mês. Isso porque as mulheres já nascem com um estoque definitivo de óvulos, que são desperdiçados naturalmente a cada ciclo menstrual. Além disso, a partir dos 30 anos, o risco de surgir doenças que podem levar à infertilidade, como endometriose, infecções e mioma, aumenta. “Falo muito para as minhas pacientes: carreira e estabilidade financeira podem ser retomadas em qualquer momento da vida, fertilidade não. Está na hora de repensar o planejamento familiar”, observa.

Mesmo se não tiver planos de engravidar, toda mulher na idade adulta deve conversar com seu ginecologista sobre fertilidade. Junqueira defende, inclusive, procurar um especialista em medicina reprodutiva para fazer exames que avaliam a reserva ovariana. Assim, ela tem condições de planejar o futuro. “Se a paciente não tiver horizonte de gravidez, deve pensar em congelamento de óvulos de forma paliativa, porque isso não significa que vai ter uma criança na geladeira esperando por ela”, esclarece o diretor da Pró-Criar. A recomendação é realizar o procedimento entre os 29 e os 34 anos. A partir dos 35, a quantidade e a qualidade dos óvulos caem, diminuindo a chance de gravidez.

A fertilização in vitro é mais uma ferramenta disponível para as mulheres que adiam a maternidade e encontram dificuldade para engravidar, mas a taxa de sucesso também diminui com a idade. Dados da Pró-Criar apontam que pacientes com menos de 30 anos têm 60% de chance de ter filhos, com o procedimento realizado em laboratório. Aos 40, o número cai para 20% e rapidamente chega perto de zero. “Depois dos 42 anos, a fertilização in vitro com os próprios óvulos é muito pouco eficaz. A indicação, se for preciso fazer tratamento, é a doação de óvulos”, informa.

Com a evolução da medicina, já não se considera mais de alto risco gravidez acima dos 40 anos, a não ser que a paciente tenha alguma doença anterior. Junqueira entende que a gravidez tardia exige um acompanhamento médico de qualidade, o mesmo que é recomendado para todas as outras mulheres.

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